terça-feira, 1 de junho de 2010

Depois: Memórias de minhas putas tristes (Gabriel Garcia Marquez)


No último capítulo, no ponto final da última página é impossível não refletir sobre o tempo,não tentar reencontrar as antigas listas de coisas-que-quero-fazer-antes-de-morrer, não revisitar a agenda telefônica dos amigos que marcaram e marcam a existência, é totalmente impossível não calar na vontade de reviver a casa antiga da infância, de procurar cicatrizes e marcas no corpo e rir sozinha de suas histórias. No depois que fecho o invólucro branco de Garcia Marquez... paro na frente do espelho: a gente, que ta de dentro não percebe o quanto envelheceu quem ta de fora vê melhor – a voz do meu pai fala em algum canto da memória. Olho pro lado: a estante de livros (extensão da minha própria pele) e vejo Drummond co-participante da minha dor, dor-do-mundo, rindo baixinho a inevitabilidade da vida:

Bati no portão do tempo perdido, ninguém atendeu.
Bati segunda vez e mais outra e mais outra.
Resposta nenhuma.
A casa do tempo perdido está coberta de hera
pela metade; a outra metade são cinzas.
Casa onde não mora ninguém, e eu batendo e chamando
pela dor de chamar e não ser escutado.
Simplesmente bater. O eco devolve
minha ânsia de entreabrir esses paços gelados.
A noite e o dia se confundem no esperar,
no bater e bater.

O tempo perdido certamente não existe.
É o casarão vazio e condenado.

(casa do tempo perdido, de Carlos Drummond de Andrade)

Um comentário:

  1. pois é... quem tá de fora percebe mais...
    mas sempre tem um que tá de dentro.
    mesmo o que percebe o seu não percebe o dele.
    somos todos mancos... mas dá pra andar com uma perna só.
    é só reinventar

    beijos

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